 |
Lourdes
Braga
PortalBARRA
: Sua vida tem muita estória para contar?
Lourdes Braga - Meus pais eram portugueses e chegaram
ao Brasil em 1937. Minha mãe dizia que o Brasil é
uma terra maravilhosa e abençoada por Deus. Passei
minha infância em São Paulo, depois vim com minha
família para o Rio de Janeiro.
|
Minha mãe
vivia para o lar e para os filhos e era muito feliz. Hoje, tudo
mudou e nem sempre as pessoas são mais felizes quando tem
que sair de casa, batalhar, enfrentar o mercado de trabalho. Mas
eu acho que está havendo um retorno, um resgate destes antigos
costumes.
PortalBARRA:
- Você decidiu seguir os passos de sua mãe?
Lourdes : Não, comecei a trabalhar muito cedo, o que
na minha época não era comum.
Meu primeiro emprego foi numa firma americana, em que um dos donos
era David Rockfeller. Depois, a firma fechou e fui trabalhar como
secretária em um banco. Paralelamente, eu estudava teatro
com Dulcina, com Madame Morineaut, Adolfo Celli, Maria Clara Machado.
Naquela época, fazer teatro era um horror e minha família
era inteiramente contra. O Cláudio Correa e Castro dirigiu
uma peça de Tenesse William na Fundação que
foi premiada, em que eu fazia um monólogo de Blanche du Bois.
O prêmio eram 3 dias no Teatro Mesbla. Não compareceu
ninguém da minha família. Neste dia, eu desisti da
carreira no teatro.
PortalBARRA:
Você desistiu de ser atriz, mas não de ter uma vida
cultural...
Lourdes: Sempre gostei de estudar. Entrei para a Puc e fui fazer
sociologia. Depois casei e tive um filho. Comecei a trabalhar nas
Pioneiras Sociais da Sara Kubitscheck, mas logo troquei por um emprego
de secretária executiva, por causa do salário bastante
compensador.
No Brasil, socióloga ainda era confundida com socialista,
com política. Mas o presidente do Banco tinha muito orgulho
em me apresentar como uma secretária executiva e socióloga,
pois no exterior socióloga era sinônimo de cientista,
pesquisadora. Depois, parei de trabalhar para me dedicar ao meu
filho até ele crescer e ficar mais independente
PortalBARRA:
- Mas a sua veia de atriz ainda estava acesa...
Lourdes: Aos 53 anos, resolvi realizar meu sonho de juventude.
Voltei ao Tablado e procurei Maria Clara, que me reconheceu
e me recebeu de braços abertos. Pedi para entrar em um
curso, mas só tinha turmas de adolescentes. Mesmo assim
eu aceitei. No primeiro dia o diretor Carlos Wilson (Damião)
me convidou para ensaiar a peça "Nossa Cidade",
em que Maurício Mattar fazia o papel principal contracenando
com Drica de Morais. A partir daí, fui para as novelas
da Globo. Fiz Selva de Pedra, Teletema, trabalhei com Domingos
de Oliveira, fui dirigida por André Matos em várias
peças. Heloisa Perissé escreveu uma peça
para mim, com o título de "A verdadeira história
de Chapeuzinho Vermelho", em parceria com Ewerton de Castro. |
|
Neste ínterim,
mudei-me para a Barra, pois meu marido estava construindo uma casa
e a Av. das Américas nem tinha iluminação.
Era perigoso sair da Barra para ensaiar no Jardim Botânico
(ainda não existia o Projac). Foi quando então abandonei
minha carreira pela segunda vez. Por isto é que eu digo que
sou uma atriz bissexta, vou e volto.
Porém,
o meu interesse pela vida cultural não esmoreceu. Eu sentia
muita falta de uma programação artística aqui
na Barra. Quando inauguraram a Casa de Cultura Estácio de
Sá, passei a freqüentar aquele espaço, que tinha
uma programação altamente qualificada, com palestras
muito interessantes, exposições de artes plásticas,
peças de teatro, música clássica, etc.
PORTALBARRA
; Como foi o seu ingresso na UNATI?
Lourdes - A UNATI - Universidade da Terceira Idade, foi uma
das melhores coisas que aconteceram na Barra. Comecei na Universidade
Gama Filho, depois fui para a Estácio de Sá e hoje
estou de volta na Gama Filho. A Unati oferece cursos para a faixa
etária de pessoas que já estão realizadas na
vida e que têm tempo disponível para se atualizar sobre
diversos assuntos. Ali a gente faz um apanhado geral de tudo o que
está acontecendo no mundo. Fazemos cursos de informática,
aulas sobre globalização, psicologia, filosofia com
o Professor Jânio Savoldi, psicossomática, dança,
canto, fisioterapia. Além dos cursos, eles proporcionam o
encontro de pessoas e oferecem uma intensa programação
cultural, como visita a museus e palestras.
As pessoas fazem uma idéia errada de que a UNATI é
só para idosos. Na verdade, o curso é para maturidade,
pode ser frequentado até por alunas na faixa dos 30 anos
que desejarem se atualizar.
PortalBARRA
- Qual é a duração do curso?
Loourdes - Nós é que fazemos a duração
do curso. Oficialmente são dois anos, mas sempre conseguimos
prorrogar. Tivemos a oportunidade de assistir palestras e participar
de workshops muito interessantes. Quando aconteceu aquela tragédia
no World Trade Center, o Professor Jânio Savoldi realizou
uma aula sobre "Pensando o Mundo após o dia 11 de setembro".
PortalBarra:
- Como aconteceu a descoberta do seu lado político?
Lourdes : - Nunca me interessei por política, até
conhecer o PT do B. Fiquei encantada com as idéias e os propósitos
que eles abraçaram. Por isso aceitei o convite e em novembro
de 2001 assumi na Alerj o cargo de Diretora da Maturidade.
Desde então, já participei de vários projetos.
Num fim-de-semana na praia, realizamos a Feira da Saúde,
onde pela primeira vez houve a distribuição de camisinhas
para a terceira idade. Tive esta idéia quando constatei que
houve um aumento muito grande do índice de casos de aids
na maturidade, pois a aids não vê idade nem nível
social. E com o advento do Viagra, os velhinhos ficaram muito alegrinhos,
começaram a pular a cerca e estão trazendo a aids
para dentro de casa. No início dos anos 90, foi registrado
apenas um caso de aids na maturidade, hoje já são
87. Estes números não são divulgados, pois
há um certo constrangimento ou mesmo vergonha. As pessoas
da terceira idade pertencem a uma época em que não
era comum usar camisinha, mas a realidade agora é outra.
PortalBarra:
Quais são os seus projetos para a Terceira Idade?
Lourdes - Quero me dedicar ao idoso carente. Além do
lazer e da saúde, minha intenção é enfocar
também oportunidades de trabalho, se ele ainda estiver apto
para tal. Hoje, muitos idosos não conseguem se manter com
uma magra aposentadoria, outros são arrimo de família.
Com este objetivo,
criei junto com a Helaide Teixeira, presidente do Movimento da Mulher,
o Projeto do Big Boy. Ao invés das empresas empregarem menores
como entregador de documentos, podem contratar os serviços
de um idoso. Além de ser mais responsável, mais cuidadoso
e ter mais credibilidade, a pessoa madura ainda tem a vantagem de
não enfrentar filas de bancos nem pagar a passagem de ônibus.
PortalBARRA:
- Este projeto já está pronto?
Lourdes: Ele está em andamento na Alerj, para ser aprovado.
Na parte de lazer, estamos pensando em organizar um Grupo de Contadores
de Estórias e outro Grupo de Chorinho, para visitar os idosos
carentes nos asilos e hospitais.
PortalBARRA:
Quantas pessoas fazem parte do Movimento da Mulher?
Lourdes: O grupo já tem 20 pessoas, mas queremos ampliar
muito mais. Marly Peçanha, que já foi sub-prefeita
de Jacarepaguá e agora é candidata a deputada, está
à frente do projeto, desenvolvendo um trabalho muito bonito
de qualificação e requalificação para
o mercado de trabalho, com o apoio do Ministro do Trabalho Francisco
Dornelles.
PortalBARRA:
Dá para conciliar a sua vida social intensa com a vida familiar
e política? O marido não fica com ciúmes?
Lourdes: - Como adoro o que faço, dá para agendar
todos os compromissos sociais, políticos e familiares. Meu
marido é uma pessoa maravilhosa, temos 38 anos de casado.
Ele sente até um certo orgulho destas minhas atividades e
me incentiva muito. Em alguns eventos ele me acompanha, mas nos
eventos em que vou me encontrar com as amigas, ele não se
incomoda, vou sozinha.
PortalBARRA:
Qual o segredo da sua jovialidade, da sua eterna juventude?
Lourdes: O segredo da felicidade de viver é procurar
ter sempre um projeto de vida, seja em que idade for. Quando se
tem um projeto de vida, a pessoa acorda já sabendo o que
vai fazer naquele dia, levanta sorrindo e se prepara para festejar
a vida. A vida é o poder supremo. Todo mundo corre atrás
de poder político, econômico, mas isto não vale
nada. O que importa é o fato de estar vivo e de se renovar
a cada dia, de se modificar, ser feliz. Este é um poder que
temos em nossas mãos e que é intransferível.
As pessoas não se dão conta disso...
PortalBARRA:
- Em outras palavras, ser feliz é se sentir útil,
produtiva...
Lourdes : Útil não só em relação
à família, mas a si mesmo. A pessoa tem que construir
a sua auto-estima que a eleve, mas também precisa ser útil
à sociedade. Eu faço parte da população
privilegiada que representa não mais que 2% do Brasil. Nós,
que temos mais condições, temos o dever de contribuir
com alguma parcela para o bem estar social, de que maneira for.
Eu encontrei esta maneira através da política. Sozinha,
já participava de trabalhos voluntários, mas era muito
pouco. Através da participação em partidos
políticos, dá para conseguir um apoio maior, uma infraestrutura
logística. Por exemplo, esta feira da praia eu não
poderia realizar sozinha.
Precisaria
de apoio para conseguir barracas, camisinhas para distribuição,
uma equipe médica para tirar pressão, exames preventivos,
etc. Isto tem um custo e é preciso buscar parcerias. Este
é o motivo real de meu ingresso na política, não
para ser candidata, porque não tenho esta vaidade, mas para
participar ativamente da política social, atrás dos
bastidores. No PT do B eu encontrei pessoas que me apoiaram, como
a Marly Peçanhae a Helaide Teixeira. Assim, posso fazer algo
mais pela melhoria de vida do cidadão, para pensar mais no
outro.
PortalBarra:
Sua idade é um segredo guardado a sete chaves?
Lourdes - De jeito nenhum. Tenho 68 anos muito bem vividos e
que em nada me impedem de realizar o que gosto.
Posso ilustrar isto citando um caso interesse que aconteceu recentemente
na Universidade Gama Filho. Em uma aula de vídeo, o professor
pediu a cada aluno que ëscrevesse num papel uma palavra sobre
um tema e sorteou na sala. Uma amiga tirou a palavra glamour. O
professor pediu que ela me entrevistasse. Quando passamos o vídeo,
ela exclamou: - Lourdes, eu não fiquei bem no vídeo,
você parecia tão mais jovem, mais linda, você
iluminou a tela...
As pessoas não podem se esquecer de que todos envelhecem,
não tem como fugir disto. Mas envelhecer com jovialidade
é o grande segredo. Nunca fiz plástica, nem coloquei
botox.... Quando era jovem, recebia menos elogio do que agora! Acho
que tenho a ajuda dos céus...
PortalBarra:
Você sente que o curso da Universidade colaborou para este
seu dinamismo?
Lourdes : - Uma coisa que eu acho fantástica nos dias
de hoje é a informação. A gente tem que evoluir
todos os dias, mudar de opinião, conhecer novas idéias,
para não ficar para trás.
PortalBarra:
Já que estamos falando em acesso à informação,
você é internauta de carteirinha?
Lourdes: Devo confessar que esta é uma falha minha. Como
a minha vida é muito ativa, não tenho tempo de ficar
na frente da tela do computador, mas mesmo assim me informo sobre
tudo através das colegas que navegam na internet. A partir
de abril, estarei participando ativamente deste site maravilhoso
que é o portalbarra.com.br, divulgando os eventos e fotos
das mulheres da maturidade na Barra.
 |
PortalBarra:
O lado artístico está atualmente parado?
Lourdes: Fui convidada para fazer dois curta- metragens.
Fiz o curta "O homem que sabia demais" na Estácio.
Fiz um longa também, o "O show da lua.com",
que ainda está sendo editado. Vendo este movimento todo,
a cineasta Cláudia Pimenta me procurou, com a idéia
de fazer um documentário sobre a minha vida. |
Então
sugeri que este documentário tivesse o título "Lourdes
Braga apresenta a mulher na maturidade". Este documentário
vai ser desenvolvido para a internet e também para um programa
de televisão. Para fazer a filmagem, ela está me acompanhando
nos eventos, como na Alerj, em chás beneficentes. Este documentário
mostrará no final o meu lado artístico fazendo o monólogo
de Harold and Maude "Ensina-me a viver".
|